terça-feira, 25 de maio de 2010

SENHORA DA SAÚDE LÁ EM CIMA




Foi repentino. Havia que subir até lá acima para registar as merendas das festas da Senhora da Saúde em São Pedro de Agostém, Chaves. No passado, as merendas que se levavam de casa para as festas  não tinham uma estrutura rígida nem obrigavam a uma comida principal, embora as carnes assadas, o fumeiro e o pão fossem elementos constantes.

Íamos à Senhora da Saúde em São Pedro. O meu pai adorava, não sei porquê, mas ele tinha uma ligação grande àquela terra. Levava-se uma grande merenda. Levavam-se toalhas, estendiam-se as toalhas. Era muita gente. Levava-se salpicões, linguiças, frango assado, galo, peru, o que havia. Carnes, sobretudo carnes e pão para acompanhar. Era comida de dedos. (Zita, 8-1-2008)

Merendar nas festas da Senhora da Saúde implicava, à semelhança do que acontecia nas outras romarias, partilhar se não a comida pelo menos a proximidade espacial com conhecidos e amigos que se encontravam por acaso ou quem se tinha combinado o encontro dias antes.

A minha sogra ia à Senhora da Saúde porque é a santa padroeira da aldeia dela. Íamos lá comer. Toda a gente leva merendas. Levávamos quase sempre carne assada, fazia-se folar, os bolos, vinho, jeropiga, mas não se usavam talheres. Mas como o meu sogro era tão conhecido, às vezes nem a merenda tirávamos do carro, porque nos chamavam para comer com eles. (Natália, 1-5-2007)

Partilhava-se, isso sim, e ainda se partilha, a expetativa do temporal. De facto, diz-se que não há Senhora da Saúde sem uma fortíssima trovoada seguida de uma intensa chuvada. Espera-se, contudo, que o temporal não suceda nem na noite de domingo, enquanto se faz a procissão das velas, nem no dia seguinte, quando saem os andores em procissão pela aldeia e, depois, enquanto se tomam as merendas.

As merendas do passado, que se preparavam e se traziam de casa, parecem ter sido substituídas parcialmente por comidas de barraca. Junto à igreja da Nossa Senhora da Saúde, dias antes da festa, vão chegando camionetas, roulotes e atrelados de comidas e bebidas. A oferta inclui frangos assados, bifanas, polvo, pipocas e algodão doce, cachorros quentes, gelados, pão, queijo, cerejas e bolos. Mas também há camionetas de atoalhados que se vendem quando a voz do padre Ladislau termina o sermão. Nessa altura, os vendedores ambulantes pegam nos megafones e iniciam a venda da mercadoria substituindo os sons sagrados pelos sons profanos.

Alguns dos comerciantes vêm à festa há já muitos anos. Não somente à Senhora da Saúde. Voltam, também, por ocasião do São Caetano e dos Santos. Dona Ana vem com o marido todos os anos a estas três festas desde há muito tempo. Vêm de Lousada e carregam a camioneta com os bolos que a família já faz há quatro gerações. Trazem, entre muita variedade, as regueifas doces. Têm clientes que lhes compram os bolos ano após ano e que já são tratados pelo nome próprio. Mas há quem prefira sentar-se nas tendas onde se assam os frangos e se coze o polvo que depois é servido em pratos de madeira. São sobretudo os homens que o fazem, transformando as tendas em territórios masculinos. Alguns aguardam as mulheres que estão dentro da igreja a assistir à missa. Depois, reunir-se-ão ao resto da família e partilharão uma manta estendida no chão do pinhal ali ao lado e comidas trazidas de casa e compradas na festa.





Foi repentino. Mas há sempre tempo para visitar os amigos que lá se deixaram. Na bagagem vieram acelgas, framboesas e groselhas que já plantei hoje de manhã enquanto o calor não apertava. Também vieram comidas lá de cima. Perguntou-me a Lila, da Pastelaria Maria: Porque não faz lá na Figueira o folar de Chaves? Fartava-se de ganhar dinheiro...

2 comentários:

  1. Ai, o folar, o folar. Para já não falar da comida da tasca do Faustino, que saudades. Fomos lá, daquela vez contigo e foi uma delícia surpreendente.
    Mas sabes, são as coisas repentinas aquelas que nos dão mais prazer....
    bjs

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  2. Também matei saudades do Faustino :)

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Sou uma antropóloga que só pensa em comida...
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