quarta-feira, 29 de agosto de 2012

ZONA DE CONTACTO



Olho para isto e já sei quem é banhista. Há sítios do penedo que não interessam nada e outros que interessam muito. As pessoas que estão colocadas junto às beiras importantes são os pescadores daqui (João, 23-7-2012)

O banhista anda de fato de banho, pede emprestado um balde de plástico colorido aos filhos, pisa hesitante as reentrâncias das rochas e convence-se que conseguirá apanhar um polvo para o almoço. Dificilmente. Os daqui levam o arsenal tecnológico rudimentar mas eficiente que guardam em casa: o bicheiro, a cana da Índia, o raifol, o cofe, a nassa, a arrilhada e a picadeira, os iscos e mais o que acharem necessário. Calções de ganga, tronco descoberto, alguns de bota-calça. Os mais novos, e mais afoitos, adotaram o equipamento dos surfistas e arriscam-se, com barbatanas, mar adentro, nas rochas  mais distantes da pancada do mar onde o mexilhão grande se encontra.
Já é assim há muitos anos: os banhistas produzem considerações estéticas sobre a paisagem marítima e os pescadores equacionam, sustentados na experiência, essa paisagem enquanto exercício de pesca. Enquanto uns veem águas calmas para se banharem, outros procuram pitronglas, barbachos, safios, robalos, mexilhão, camarão, caranguejo, polvo, percebes, ouriços e minhocas. Diferentes modalidades de apreciação da paisagem.
Cruzam-se uns e outros no penedo, de Buarcos à praia da Murtinheira, os banhistas de olhos postos nos pescadores, os pescadores de olhos postos nas beiras. E há também os pescadores que vêm de fora e que são híbridos na relação com o mar e com o penedo: banham-se e pescam.
No penedo, esse território fluído, por força das marés que ora o alagam, ora o descobrem. Que ganhou nomes de terra, como as Pombas, porção de rochas que foi buscar a designação a um casal agrícola situado em terra. 


segunda-feira, 27 de agosto de 2012

sábado, 25 de agosto de 2012

DO SAL

Hoje à tarde, nova visita ao Núcleo Museológico do Sal. Para mostrar à família de cá, e à que está de visita , as coisas do sal, das salineiras e dos marnotos.


Aproveitou-se, também, para uma incursão aos campos de salicórnia. Colheram-se alguns pedaços para temperar as batatas à moda da minha avó Susana que vão ser feitas agora para o jantar.


sexta-feira, 24 de agosto de 2012

MORRACEIRO?

Não sei. Faltando-me o Sr. Manuel Paurrinhas, faltam-me as certezas se aquela areia esfarelenta em forma de milhentos tubos e misturada com os limos é ou não o morraceiro.  Serão estas as colmeias de areia feitas pelas minhocas que os homens do penedo apanham para usar como isco e que o Sr. Manuel me referiu?

Isto aqui nos penedos cria-se uma lama nas rochas, aquelas mais lisas, cria um morraceiro. A gente esfarrapa o morraceiro e dá daquelas minhocas grandes (Manuel Paurrinhas, 26-7-2012).


Quando estive no Núcleo Museológico do Sal a aprender a fazer o cofinho das enguias falaram-me da Ilha da Morraceira e eu, que andava às voltas com o termo morraceiro, aproveitei para pedir mais informação a quem sabia. 
A Prof. Filomena Martins explicou-me que: "o conceito de morraça estará associado a áreas húmidas (alagadiças) tanto costeiras e estuarinas como pantanosas. Mesmo no caso da referência ao habitat da spartina marítima (morraça), como sendo de areias marítimas, pode estar associada aos espaços interdunares que, com alguma frequência, podem ser ocasionalmente alagados. A morraça está igualmente associada a algas (moliço – conjunto de diferentes tipos de algas de fundos siltosos e silto-arenosos) e a uma mistura de silt (material muito fino com componentes orgânica e minerais) com matéria vegetal (estrume vegetal)". 



quarta-feira, 22 de agosto de 2012

COSTURAR PRESENTES


Hoje, com a preciosa ajuda da Guida, e a partir deste modelo.


sábado, 18 de agosto de 2012

AS COMIDAS DA SAFRA

Lá estavam, junto ao armazém de sal do Sr. António, as sardinhas com azeite e vinagre e as batatas assadas na grelha a lembrar o que se comia em dia de safra. E as cestas com as rodilhas (também chamadas de sogras) prontas para serem usadas pelos participantes desta safra à antiga organizada pelo Núcleo Museológico do Sal.


A merenda da manhã teve petiscos variados trazidos pelos participantes. Depois de algumas hesitações (andei a oscilar entre os brigadeiros com flor de sal e os muffins com alecrim, azeitonas e queijo), acabei por optar por uma via mais tradicional e fiz as broas de batata cuja receita me tinha sido passada na véspera pela D. Aida. Na noite de sexta-feira, tripliquei a receita base e acabei a amassar, à mão, mais de oito quilos de massa. E a falta que me fez um forno a lenha para cozer tudo de uma vez! Mas valeu a pena que ficaram bem gostosas. E aprovadas pela D. Aida.  


Terminada a safra, e enquanto o Rancho Etnográfico de Lavos atuava, andaram as mulheres, como antigamente, a distribuir as freiras. As freiras são as pipocas que os marnotos davam no final da faina. Como não havia dinheiro para o azeite e o óleo não se usava, colocava-se no fundo do tacho um pouco de areia para os grão de milho não queimarem. Depois, tinha de se passar as freiras pelo crivo para as separar da areia. Eram servidas com talhadas de melão para refrescar as bocas.


sexta-feira, 17 de agosto de 2012

BROAS DE SALICÓRNIA

Depois dos cofinhos no sábado passado, hoje de manhã a D. Aida ensinou-me a fazer as broas de salicórnia. E as broas doces. As broas de salicórnia são feitas com farinha de milho e farinha de trigo, fermento de padeiro, água, sal e salicórnia, uma erva que cresce nas salinas e que pode ser usada como tempero salgado, em substituição do sal ou juntamente com este.
A utilização na culinária local é recente e ainda não parece estar muito generalizada, apesar da salicórnia ter uma textura e um sabor bastante agradáveis. 
Não exige nenhuma preparação prévia, mas aconselha-se a que somente as pontas dos ramos, ou seja, as partes mais tenras da planta, sejam aproveitadas.


Ainda houve tempo para o registo oral da receita das broas doces com batata. Esta noite, já as fiz, e amanhã lá irão no cesto da merenda para partilhar com os restantes participantes da safra organizada pelo Núcleo Museológico do Sal.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

PIRI-PIRI

Para meninas com a língua atrevida

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A FLOR DO JARDIM


A par da máquina registadora e de alguns expositores de roupa, esta coleção de carimbos é uma das poucas coisas que ficaram da loja do meu avô e do meu pai. Encontrei-a esquecida numa gaveta na arrecadação quando a semana passada andei a fazer limpezas na tralha. 


Um dos meus entreténs, em miúda, quando passava as tardes no sótão da loja (para onde subia a medo, porque achava sempre que algum dos manequins ia ganhar vida!) era brincar com estes carimbos. O que basicamente dava sempre direito a repreensões. Isso e fazer com que o escadote de ferro me atingisse a cabeça.


Faltam letras e números e alguns dos carimbos já estão descolados. Mas no dia em que faz 10 anos que o meu pai morreu, pareceu-me uma boa ocasião para cuidar que fiquem em melhor estado.

sábado, 11 de agosto de 2012

O COFINHO DA MERENDA E DAS ENGUIAS


Passei o dia de hoje no Núcleo Museológico do Sal a aprender a fazer um cofinho. Os cofinhos são cestos que, no passado, eram usados para levar a merenda quando se ia apanhar enguias e para se transportar estas quando se ia vendê-las à Figueira da Foz.


A D. Aida só aprendeu a fazer estes cestos há dois anos com o único homem que ainda os faz. O modo como se apanham e preparam os juncos nas salinas é distinto do que vi fazer em Salto com o Sr. Constantino no projeto com o Ecomuseu de Barroso. Aqui, os juncos não são cortados pela base, mas sim arrancados. Também não são delubados nem maçados. Ficam três meses a secar à sombra e quando vão ser utilizados têm de ser humedecidos com, pelo menos, 24 horas de antecedência. Neste último ponto a técnica aproxima-se daquela que observei em Salto.


Não é fácil aprender esta técnica. Passámos a manhã inteira em tentativas frustradas sem atinar com a sequência de gestos, mas antes do almoço fez-se luz :)   




 Base do cofinho que estou a fazer.

Depois do almoço num antigo armazém de sal, onde a D. Aida nos serviu uma opípara refeição, voltámos para o Núcleo Museológico do Sal para ver fazer mais algumas etapas da construção do cofinho e continuar a tecer as bases dos nossos cofinhos. D. Aida já se disponibilizou para nos receber em sua casa para podermos completar esta aprendizagem. Lá irei. Mas não são apenas os cofinhos da D. Aida que me interessa aprender a fazer. No dia 17 irei ver fazer broa de milho com salicórnia. E no dia 18 volto ao Núcleo Museológico do Sal para participar numa safra à antiga.


sábado, 4 de agosto de 2012

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

DO PENEDO

Voltámos hoje de manhã ao Penedo. Na companhia da Guida e da D. Eduarda, mulher do Sr. Manuel Paurrinhas, fomos ver as rochas e carreiros cujos nomes ainda faltava assinalar. Pescoço do Cavalo, Leivada, Beira dos Ouriços, Costado, Carreiro Rico, Penedo Pequeno, Caixão e Pedra da Nau.
Lá em baixo andavam os homens a apanhar robalo e percebes e, mais adiante, os surfistas que, momentos antes, tinham passado por nós. Entre os nomes das pedras houve tempo para falar da relação complexa que se foi construindo com o mar nesta zona de contacto que abarca as areias, as rochas, a água, a fauna marinha e os homens.
Quem no penedo zaragateia nunca se deita sem ceia revela a importância das rochas na economia local e o papel fundamental que o Penedo desempenhou em momentos de grande carência, nomeadamente durante a II Grande Guerra. 
Era também ao Penedo que voltavam todos os anos, por alturas da Quaresma, as gentes das localidades de Brenha, Allhadas e Tavarede, entre outras, para apanhar ouriços, percebes e mexilhão e garantir a proteína animal quando o interdito religioso afastava a carne da mesa.

 Manuel Paurrinhas a ensinar-me o mar

Pedra da Nau

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A TRÊS MILHAS DO PENEDO

Dizem os homens dali que no penedo só não se comem as pedras e os limos. Mas também se vai pescar mais longe. De bote e com o robalo em vista. É no Coberto, pedaço de mar onde as pedras nunca ficam visíveis.

Na Medroa é onde a gente entrava quando havia mar. Quando havia vagas os barcos saíam para a pesca e depois o mar alteava e a gente tinha de esperar que a maré enchesse para vir para dentro porque na Figueira havia uma barra muito fraca. Então a gente esperava que a maré viesse para cima para entrar. Havia ali um farol. É a indicação da gente para entrar (Paurrinhas, 23-7-2012).

Manuel fazia a pesca do robalo à linha. Do rile desenrola-se o fio de seda. 100 metros. Em cada duas braças, e mais um pouco, ata-se um estralho, fio de seda com o comprimento de uma braça. E preso no extremo do estralho, o anzol. Em cada sete anzóis leva uma bóia pequena. Nas extremidades, as pedras e as bóias sinalizadoras de maior dimensão.

Cada palanque leva duas pedras, uma em cada ponta. As bóias, a gente marcava por terra. É aquele poste por aquele, aquela casa por aquela. Às vezes com névoa é mais difícil. Mas são umas bóias maiores. São pintadas ou numeradas. Uma em cada lado. E essas pequenitas para deixar a linha não ir ao fundo. O isco era o pilado. Era um caranguezito, servia de isco, o pilado. São pequeninos (cabem na palma da mão). Há uma parte da asa maior, que corta mais, é mais rijo, a gente crava o anzol por baixo da pata e o pilado fica sempre vivo, aguenta-se dias e dias vivo. Lá no coberto. (Paurrinhas, 26-7-2012).


 Rile com fio de seda

Anzol preso com o estralho



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Sou uma antropóloga que só pensa em comida...
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