Uma das primeiras coisas que os devotos do Templo da ISKCON em Lisboa me ensinaram sobre comida foi a classificação dos alimentos nos três modos da natureza material.
O verso Se alguém Me oferecer, com amor e devoção, folhas, flores, frutas ou água, Eu as aceitarei, do Bhagavad-gita, funciona como a fonte primacial de um código culinário que, integrando prescrições e interdições, rege as práticas alimentares dos devotos.
O entendimento desse código culinário traduz-se, desde logo, pela classificação dos ingredientes nos três modos da natureza material, ou seja, o modo da bondade, o modo da paixão e o modo da ignorância, sendo apenas os primeiros, isto é, os ingredientes classificados no modo da bondade, considerados elegíveis pelos devotos.
O Bhagavad-gita define os ingredientes no modo da bondade como aqueles "(...) que aumentam a duração da vida, purificam a existência e dão força, saúde, felicidade e satisfação. Semelhantes alimentos são suculentos, gordurosos, saudáveis e agradáveis para o coração". Quanto aos ingredientes no modo da paixão são definidos como aqueles que "(...) são muito amargos, muito acres, salgados, quentes, picantes, secos e ardentes (...) e causam sofrimento, miséria e doença". Finalmente, os ingredientes classificados no modo da ignorância são aqueles que foram "(...) preparados mais do que três horas antes de serem ingeridos, alimentos insípidos, decompostos, putrefactos e alimentos que consistem em refugos e substâncias intocáveis (...)".
Para os devotos existe um pacote de ingredientes considerados interditos e que os mesmos classificam quer no modo da ignorância, quer no modo da paixão. Esse pacote inclui a carne, o peixe, os ovos, o alho, a cebola, os cogumelos, o álcool, o vinagre, o café, o chá preto e o chocolate.
Esta classificação tripartida da comida, bebe a sua inspiração no Ayurveda, a Ciência da Vida, que identifica três gunas ou qualidades da substância cósmica, prakrti, sendo o equilíbrio entre estas três qualidades essencial para a harmonia mental e física do indivíduo.
As três qualidades são chamadas de sattva (corresponde à verdade, à virtude e ao equilíbrio), rajas (corrsponde à força e à impetuosidade) e tamas (corresponde à ausência de movimento).
Estas três gunas referem-se, também, a ingredientes, modos de preparação da comida e quantidades ingeridas.
O álcool, a carne, as cebolas, comidas com cheiros muito intensos, comidas esturricadas ou mal preparadas e excessivamente condimentadas são normalmente referidas como comidas tamásicas. Tal como a gula é também considerada tamásica. Inclui todos os ingredientes que levariam o indivíduo a um estado de indolência.
Comida rajásica é aquela que é bem preparada, moderadamente condimentada e inclui ingredientes delicados, sem qualidades ayurvédicas antagónicas e consumida de forma moderada.
A comida satávica inclui todos os ingredientes que não são excitantes e tem um efeito moderado nos humores. É de fácil digestão e não torna o indivíduo preguiçoso. Frutas, arroz, leite, mel, ghee, vegetais como cenouras, courgetes e abóboras incluem-se nesta categoria. Desta forma de comida excluem-se a carne, as especiarias, o gengibre, o alho, os vegetais que agravam os humores como a couve flor, as cebolas e as beringelas.
Se um indivíduo procurar uma alimentação saudável e equilibrada, deverá incluir alimentos classificados nas três gunas. Contudo, se buscar uma vida ascética, deverá privilegiar apenas os ingredientes classificados como satávicos*.
*Sobre esta classificação tripartida da comida pode consultar-se o livro Ayurveda: a way of life, de Vinod Verma.
e não podemos só comer, e gostar ou não gostar?
ResponderEliminar:) Podemos!
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